Will the real leftwinger please stand up?

terça-feira, 19 de janeiro de 2010

Foda-se.
Gostaria de ter algo mais a dizer, acerca da esquerda portuguesa, esse monólito estúpido e grotesco, mas não tenho. "Foda-se" é a única interjeição possível.

Vivemos nisto. E nisto. Discussões átonas e insuportáveis, sempre em frente ao espelho e uma incapacidade absoluta de perceber que a esquerda, enquanto viver da moral, da cartilha dos costumes, das prelecções e dos utopismos onanistas, não chega a lado nenhum.

Isto era aquilo em que eu acreditava. Que "um outro mundo é possível". Já não acredito. Não acredito em gente que planeia manifestações anti-globalização com MacBooks Pro. Não acredito em gente que lê o último post no IndyMedia através de um smartphone com Windows Mobile. Não acredito em pessoas que compram casas, carros, computadores, sapatos, maquilhagem, bilhetes para o futebol ou telemóveis com cartão de crédito, enquanto trucidam a lógica perversa da especulação financeira e do neoliberalismo. Não acredito em pessoas que gastam €30 em jantares no Bairro Alto, discutindo a última moda da vanguarda revoluciono-asceto-leninista. Desconfio de pessoas que compram jornais revolucionários cuja tinta é tudo menos reciclável. Gente que se excita com o iTunes e não sabe usar Linux (que me desculpe quem não merece a crítica - esta hiperventilação só se dirige aos moralistas que inquinaram a esquerda, não a quem declarou independência do moralismo autoritário; usem os Macs que quiserem, sejam felizes como a Emma Goldman queria e façam o que vos der na gana, porque ninguém deve ser obrigado a fazer de tudo um acto explicitamente político.)

Acima de tudo, não posso confiar em pessoas que se arvoram em revolucionárias, mas não apregoam mais que um revolucionarismo de cordel. Anarquistas, fãs de Frankfurt, fãs do Marx jovem, de meia-idade, velhote, idólatras de Negri, Hardt e Badiou. Já sabemos que vocês conhecem todas as obras acerca de tudo. Já sabemos que nenhum conservador escreve bem. Também já sabemos que a vossa verve retórica é inefável. Que vocês escrevem melhor que todos os Baudelaires deste mundo. Que os modos de produção capitalista estão condenados à autofagia e que, em breve - não percam o próximo episódio - dará lugar à emergência de uma sociedade sem classes.

Sabemos essa merda toda. Eu sei essa merda toda. Sei o que é a taxa Tobin. Não sei muito bem o que é a taxa Spahn, mas tento. Sei o que é o multiculturalismo. Também sei o que é uma associação anti-proibicionista. E o que é uma comunidade anarquista. E quem foi Kropotkin.

Mas não me interessa. Vocês não me interessam. E não é um exagero se disser que represento, metonimicamente, uma franja do vosso "eleitorado", das ovelhinhas que vocês querem proselitizar. Tenho um portátil e uma Playstation3; uma data de livros comprados na Amazon e no Book Depository; um gosto pequeno-burguês coincidente com o meu capital social e cultural.

A diferença? Eu não me armo em Inácio de Loyola, em Savonarola ou em Torquemada da Comuna. Cinjo-me às minhas contradições e tento fazer o melhor que posso, sem sermões, sem exageros, sem a filha da puta da vossa antipatia. É que, deste lado, do receiving-end, HÁ SERES HUMANOS. Sabiam?

Vocês são cansativos, agoirentos, exasperantes - tal como eu. Mas o vosso pedantismo é uma praga. A vossa imoralidade moralista é gritante.

Acima de tudo, a vossa falsa consciência é demasiado odiosa. O vosso gosto burguês derrota-vos: quem tem o vosso estilo de vida injecta quantidades estapafúrdias de capital no capitalismo. NO CAPITALISMO, CARAÇAS! Nesse Leviatã selvagem! As vossas compras na Amazon! O vosso sushi na Bica do Sapato! Os vossos sapatos sei lá de que marca! O iPhone! Um delírio galopante que vos esconde o seguinte:

Vocês também vivem na Matrix.

Vocês são o alter-ego do Robert Kagan, do Karl Rove e do Dick Cheney. Ninguém vos suporta, mas, como vivem num ecossistema incrivelmente limitado e saturado, passa-vos ao lado. Não consigo distinguir-vos de uma inteligência artificial; não conseguiria distinguir-vos de um robot com um blog.

E claro, vocês quiseram a pílula vermelha.

Fico deprimido. Devia estar do vosso lado da barricada. Devia sentir-me inspirado pela vossa agilidade mental. Magnânimos representantes de um movimento humanista que pretende libertar cada sensibilidade do jugo explorador, do pensamento único neoliberal. Mas vocês são apenas uma sombra das vossas pretensões.

Por isso, mais uma vez: foda-se.

A todos os que lerem isto e se sentirem ofendidos: desculpem. Gostaria de ficar menos enervado com atitudes sobranceiras da parte de quem não reconhece hierarquias, mas, ao contrário do que o nome deste blog possa indicar, não sou fã do Zen. É mais da arte de divagar.

2 comentários:

Beko disse...

foda-se

Julia disse...

Fo... olha que que... caralho pah!