I have no mouth and I no longer scream.

segunda-feira, 22 de março de 2010

Tu caminhas.

Um pé ante outro.

Tu caminhas e questionas a areia. Revolta e insensata. Resmungas, porque te asperge com fúria.

Mais um passo.

Estás barricado atrás de uma secretária. De semblante carregado, colocaste a máscara de combate que te requalifica como arma de fogo produtiva. És uma roda na engrenagem. Já não tens boca, mas também já não queres gritar.

A tua fúria é porosa, é como a areia que te vergasta.

Estacas e despes-te.

Afagas o teu rosto. A tua boca desapareceu. A tua vontade de gritar esvai-se. És uma ampulheta vazia. You are Jack's fantasylust. Tu est la haine de l'ennui.

Desfazes-te da roupa, edificas multidões e tornas-te anacoreta hesitante.

Retomas o caminho. Semblante carregado e destino opaco.

És a peça lateral de um mecanismo de controlo que não consegues ver. És um tijolo insano do templo à divindade que não vislumbras. És a revolução perdida em dias chuvosos, bares com cheiro a tabaco de enrolar. És a frase incompleta de Jack Kerouac. Rodas sobre ti mesma, pensando que estás a perder o tino, dizes "que tino? que sanidade?" e lembras-te de que já nada podes dizer. Não tens boca e não podes gritar.

Sentas-te e deixas a tua pele ao relento. A multidão edificada acumula-se.

És a revolução de um só ser. És todos os livros de auto-ajuda que desqualificaste, de olhar pedante. És todas as pastas benzidas lançadas aos astros. És todas as opressões do mundo comprimidas num olhar de escárnio da pobreza.

I no longer scream. We have no mouth.

Tu caminhas. Herdaste a ligeireza do Homo Habilis. Queres ser pintada num mural de Diego Rivera. Queres não ser precário. Queres não ser perdido. Queres nunca mais. O quê? Nada, só nunca mais. Queres ser o nunca mais triste, o nunca mais insatisfeito, o nunca mais angustiado, queres ser a nunca mais oprimida, a nunca mais violada, a nunca mais atirada para um rio de história.

Repentinamente, olhas. E a multidão não está lá. Só os espelhos te admiram. És um imbondeiro solitário. Um recife de coral empalidecido.

E páras. dE mORTE à eSPREITA, hesitas. Queres conversar. Queres realizar o teu destino numa troca de palavras.

But you no longer have a mouth. You can no longer scream.

És a tragédia que tentaste evitar. És uma rede estraçalhada de pescador. És um conbate perdido à partida.

E continuas alegre. És a areia movediça que desejas.

0 comentários: